No Estado do Rio de Janeiro, 577 adolescentes que cumpriam internação em unidades superlotadas tiveram a medida socioeducativa substituída por outra de meio aberto ou foram transferidos para a internação domiciliar desde a concessão da liminar proferida em maio deste ano pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF). Deste total, apenas 3,8% voltaram a ser apreendidos em razão da prática de um novo ato infracional.
É o que mostra um levantamento da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) anexado ao Habeas Corpus 143.988, em tramitação no STF. O caso está previsto para ser analisado pela 2ª Turma do Supremo, composto por cinco ministros, que podem ou não confirmar a liminar concedida de forma monocrática por Fachin.
Movido pela Defensoria Pública do Espírito Santo, o HC visa a dar uma solução para o problema da superlotação das unidades de internação. Ao analisar o pedido, Fachin fixou a taxa de ocupação em 119% para os estabelecimentos destinados aos adolescentes em conflito com a lei. Essa decisão foi estendida ao Rio de Janeiro, Bahia, Ceará e Pernambuco em razão de um pedido feito pelas Defensorias Públicas destes estados.
Segundo explicou o defensor público Pedro Carrielo, responsável pelo caso no STF, a liminar determinou a transferência dos jovens internados em unidades que funcionam acima da capacidade. No entanto, na impossibilidade de se realizar este procedimento, a decisão é incluir os jovens em programas de medidas socioeducativas de meio aberto, como a liberdade assistida, ou aplicar a internação domiciliar.
A defensora Beatriz Cunha, coordenadora da Coordenadoria da Defesa dos Direitos das Criança e do Adolescente (Cdedica), afirmou que não se trata de uma liberação pura e simples. De acordo com ela, os jovens transferidos para o programa de meio aberto têm de ser acompanhados pelos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) semanalmente. A liminar também estabeleceu critérios, dentre os quais contemplar os jovens cujos atos infracionais não tenham sido praticados mediante grave ameaça ou violência. Para a defensora, os resultados da pesquisa desmistificam a ideia de que a decisão causou abalo à segurança pública do Rio de Janeiro.
– O impacto residiu somente na atenuação da degradante situação de superlotação que marca o sistema socioeducativo fluminense, até então caracterizado por jovens trancados em celas, sem acesso à escola nem atendimentos técnicos. O veredito, portanto, construiu bases para um acompanhamento efetivo desses meninos e para o cumprimento de uma medida realmente socioeducativa – afirmou.
Levantamento
O levantamento foi feito pela Diretoria de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça e a Cdedica, entre 5 e 9 de agosto e levou em consideração as decisões envolvendo jovens que cumpriam a internação nas comarcas da capital do Rio, Belford Roxo, Campos dos Goytacazes e Volta Redonda – cidades onde há unidades de internação no estado.
Na capital, foram 373 jovens liberados, dos quais apenas 4% foram apreendidos novamente. Em Belford Roxo, dos 67 adolescentes beneficiados com a liminar, nenhum voltou a ser apreendido. Já em Campos dos Goytacazes e em Volta Redonda foram registradas 85 e 52 liberações. O índice de reiteração de novo ato infracional nessas cidades foi, respectivamente, de 4% e 7%.
Segundo Carolina Haber, diretora de Pesquisas da DPRJ, os dados ajudam a questionar alguns preconceitos relacionados aos adolescentes infratores.
– A pesquisa mostra que respeitar a lotação das unidades de internação não significa dar a oportunidade para o cometimento de novos atos infracionais. O respeito aos direitos desses adolescentes é primordial e não implica em ofensas a outras pessoas – afirmou.
O levantamento teve como objetivo verificar todos os casos em que a Justiça do Rio deu cumprimento à medida liminar do Ministro Fachin. A partir disso, o esforço concentrou-se em analisar se os jovens contemplados com a decisão foram apreendidos em razão da prática de novo ato infracional.