Escassez de  água, às vezes vinda de reservatórios contaminados por fezes de animais; privação de banho de sol; falta de colchões; refeições que se resumem a ovos;  presos  que, após dias de jejum absoluto, comem papel higiênico molhado para enganar a fome; corredores alagados pela chuva; constrangimentos impostos às visitas; superlotação; “batismo de sangue”, com tapas, pisões e socos para os recém-chegados; detentos doentes e com o rosto coberto por hematomas. 

Essa, segundo a coordenadora do Núcleo de Cadeias Públicas e Apoio ao Preso Provisório (Nucapp), Simone Estrellita da Cunha, é uma “pequena amostragem” da situação carcerária no Rio de Janeiro, descrita em relatório elaborado pela Defensoria Pública e pelo Ministério Público e divulgado por ela, na segunda-feira (18), durante o  debate “Prisão, A Casa da Tortura”. 

Organizado pelo Fórum Permanente de Direitos Humanos, o evento reuniu, no auditório da Escola de Magistratura (Emerj),  defensores públicos,  desembargadores, juízes, promotores, advogados e representantes de instituições e entidades de combate à tortura.  Acompanharam o debate o coordenador de Defesa Criminal, Emanuel Queiroz Rangel; o coordenador do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos, Fábio Amado; o defensor do núcleo, Daniel Lozoya; e a coordenadora do Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher, Arlanza Rebello.

- O preso deixa de ser pessoa e passa a ser objeto da política de segurança – disse a coordenadora do Nucapp. “A tortura é a inflição de dor desnecessária aliada ao sentimento de perversidão.”

Segundo Simone Estrellita, “a luta contra a prisão como casa de tortura é luta de todos”.

-Não há nenhuma previsão legal para tamanha violação de direitos humanos. O preso também é cidadão. É trágico e dói atender um preso que não tem o mínimo básico a um ser humano, um homem que pede água da bica enquanto conversa com o defensor - destacou, para acrescentar que a audiência de custódia é um mecanismo capaz de tornar a situação menos dramática.

Presidente do fórum permanente, o desembargador Sergio de Souza Verani  chamou à criação de “ um movimento pela luta antiprisional” para “cercear o estado punitivo”.

-  A pena privativa de liberdade é desumana e cruel -  resumiu.

A desembargadora Denise Levy Tredler, presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos,  frisou que os magistrados necessitam de “consciência e sensibilidade”  para analisar o que se passa nas unidades carcerárias.  “A responsabilidade do juiz criminal não é apenas mandar prender. Banalizamos a violência e desrespeitamos a condição humana, inclusive no tratamento às visitas”.

-É espantosa  a extensão da punição aos familiares dos presos -, explicou, para enfatizar que é necessário “evitar prisões por bagatela” e criticar a proposta de redução da maioridade penal, “na contramão do direito internacional”.

“Cardápio descriminalizante”. Essa foi a sugestão apresentada por outra participante do debate, a professora de Criminologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Vera Malaguti Batista.  “Existe a colossal inculcação de que o sistema penal vai resolver os problemas brasileiros”, afirmou.  Segundo ela, prevalece a “fé na punição como reguladora dos conflitos sociais” e, no rastro, vêm a proposta pela redução da maioridade penal e o “discurso criminal da vingança”.

- Os presos não entram numa pauta política progressista.  Suspeitos são exibidos como troféus, o que á abuso de direitos humanos.  A visita íntima de familiares é uma tortura.

Única componente da mesa a se declarar favorável ao encarceramento como punição, a juíza da Vara de Execuções Penais (VEP), Georgia Vasconcellos da Cruz, alegou haver “falta de razoabilidade na Defensoria Pública, na Magistratura, nos militantes de direitos humanos, na bancada da bala”.

-  Lidar com o preso é muito difícil. A deficiência começa na investigação policial.

 A magistrada mencionou também que, se falta atendimento médico nas prisões, também não há médicos na rede pública de saúde. 

E comentou sobre a revista íntima:

-Não temos scanners em todas as unidades do estado, não temos condições de fazer todos os visitantes passarem pelos scanners e os equipamentos detectam somente metal, deixando passar drogas e pistolas Glock.

 



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