Portadores de epilepsia grave que já não respondem mais ao tratamento têm a esperança de dias melhores renovada com a atuação da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. Em dois casos, a instituição conseguiu garantir o uso do canabidiol – medicamento produzido com substâncias derivadas da maconha. Segundo pesquisas recentes, o remédio tem contribuído para uma melhora considerável na qualidade de vida dos pacientes. Em um caso, a DPRJ obteve decisão que obriga o Estado a fornecer o medicamento a um jovem de 13 anos. Em outro, fechou um acordo extrajudicial pelo qual uma operadora de plano de saúde se comprometeu a reembolsar a usuária pelos gastos que tem com a terapia.
A decisão judicial foi obtida pela DPRJ no dia 3 de outubro e beneficiou João Pedro, de 13 anos, morador de Duque de Caxias. A mãe dele, Gesilene Afonso, explicou que o filho é autista e, desde os nove anos de idade, sofre com a epilepsia. Aos 10, ele foi submetido a uma cirurgia para conter as convulsões. Com o procedimento, as crises diárias caíram de 20 para seis. No entanto, o resultado não foi suficiente para garantir ao jovem uma vida normal.
– Ele toma remédios muitos caros e pesados. E está sem estudar desde abril. Ele chega a ter de cinco a seis crises por dia, e quando elas acontecem no colégio, por vezes ele se machuca. É que as crises são muito pesadas, ele perde o controle de todo o corpo – explicou Gesilene.
A defensora Marina Lopes, que atua na comarca de Duque de Caxias, acompanha o caso de João Pedro desde 2015, quando a família buscou a DPRJ para requerer dos entes públicos o fornecimento gratuito dos medicamentos. Ela conta que o jovem não conseguia mais responder ao tratamento convencional. Diante do quadro, os médicos receitaram o uso do canabidiol. Com a prescrição em mãos, a estratégia foi ingressar com uma ação para que estado e munícipio fornecessem o medicamento. A petição inicial foi redigida pela defensora Alessandra Bentes.
– São situações muito delicadas em que as famílias já tentaram todos os tratamentos para garantir o mínimo de qualidade de vida a esses pacientes. Nós temos recebido alguns desses casos e por ora obtivemos sucesso em dois deles. A demanda é legítima na medida em que o médico assistente prescreve o canabidiol como solução e não há porque o Estado se negar a fornecer o medicamento – destacou a defensora Alessandra.
De acordo com a defensora Marina, a decisão obtida obriga o Estado a fornecer o medicamento. O descumprimento da medida está sujeito ao bloqueio dos valores correspondentes aos gastos que o paciente terá com a compra do remédio, diretamente das contas do ente público. Na avaliação da defensora, a medida é importante para assegurar o direito dos pacientes ao adequado tratamento.
– A possibilidade de importação do medicamento com o princípio ativo do canabidiol, permitida através de alteração na legislação em 2015, trouxe uma esperança para aqueles que não respondiam mais aos medicamentos convencionais. No caso específico do João Pedro, em que a família não possui condições de arcar com os altos custos do mesmo, a solução foi se socorrer do Judiciário para que o medicamento fosse fornecido pelo estado e município – acrescentou a defensora Marina.
A 7ª Vara Cível de Duque de Caxias atendeu ao pedido da Defensoria. Ao destacar que a “Constituição Federal dispõe que a saúde é um direito de todos e dever do estado”, a decisão deu 72 horas, a contar da data da notificação da decisão, para que estado e município forneçam os medicamentos, “sob pena de sequestro dos valores correspondentes em quaisquer das contas correntes tituladas pelos réus, além de outras medidas de apoio, porventura necessárias nas esferas cível e criminal”.
Acordo extrajudicial
Além do caso de João Pedro, a Defensoria Pública em Duque de Caxias já havia garantido, por meio de um acordo extrajudicial com a operadora de saúde Amil, o uso de medicamento à base do canabidiol a outra criança, também portadora de epilepsia grave. Pelo acordo, conduzido pela defensora Alessandra e firmado em junho do ano passado, o plano se comprometeu a fornecer o medicamento.
– Nessa hipótese a operadora de saúde foi bastante sensível à situação da paciente e reconheceu como sua a obrigação de fornecimento, não sendo necessário sequer acionar o Judiciário. Eles têm importado o medicamento e fornecido à assistida regularmente. É um avanço é uma economia de tempo, de sofrimento e de recursos para todos os envolvidos – destacou a defensora Alessandra.