Uma mulher transexual internada à força em uma clínica psiquiátrica, por ordem da própria mãe, obteve o direito às medidas de proteção previstas na Lei Maria da Penha. O pedido foi formulado pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro ao Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de São Gonçalo, onde a vítima reside com a sua companheira.
Pela decisão, proferida no último dia 26 de maio, a mãe, que não aceita a identidade de gênero e a orientação sexual da filha, está proibida de se aproximar dela dentro de um raio de 500 metros. A decisão também veda a mãe de tentar contato com a filha e determina a busca e apreensão de todos os objetos pessoais da vítima e da companheira dela que estão na casa da mãe.
A atuação conjunta dos órgãos da Defensoria Pública do Rio de Janeiro envolvidos na defesa dos direitos da mulher, em parceria com a Rede de Atendimento a Mulheres em Situação de Violência, garantiu essa pronta assistência.
Flávia Nascimento, defensora de São Gonçalo, tomou conhecimento da agressão à jovem no sábado dia 20 de maio, por meio da Rede de Atendimento. As providências adotadas pela defensora naquele mesmo dia foram fundamentais para que o caso fosse tratado com base na Lei Maria da Penha ainda na delegacia e, assim, levado ao Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher.
A coordenação de Defesa dos Direitos da Mulher e o Núcleo de Defesa dos Direitos Homoafetivos e Diversidade Sexual da Defensoria, coordenados pelas defensoras Arlanza Rebello e Lívia Casseres, também foram acionados.
Arlanza realizou atendimento emergencial com a vítima no domingo dia 21, ainda no abrigo para o qual ela fora encaminhada após ser liberada pela clínica psiquiátrica onde a mãe a internara. Ali foram prestadas todas as orientações à jovem e marcado o primeiro atendimento com as defensoras Flávia e Lívia. No dia seguinte, segunda-feira 22, as defensoras Flávia e Lívia ingressaram com a ação no juizado de São Gonçalo.
O juiz André Luiz Nicolitt, titular daquele juízo, deferiu as medidas de proteção previstas na Lei Maria da Penha, como requerido pelas defensoras. Na decisão, o juiz destacou que a “genitora da vítima desrespeitou gravemente a identidade de gênero assumida pela filha, internando-a em clínica de outro estado, privando-a do convívio com sua companheira e afastando-a dos demais entes familiares e de seus amigos”. Além de ter sido levada à força, a jovem foi sedada e teve os cabelos raspados.
– A Lei Maria da Penha cuidou da violência baseada no gênero e não vemos qualquer impossibilidade de que o sujeito ativo do crime possa ser uma mulher. Isso porque a cultura machista e patriarcal se estruturou de tal forma e com tamanho poder de dominação que suas ideias foram naturalizadas na sociedade, inclusive por mulheres. Sendo assim, não raro, mulheres assumem comportamentos machistas e os reproduzem, assumindo o papel de opressor – escreveu o juiz.