A Defensoria Pública do Rio de Janeiro apresentou à Corte Interamericana dos Direitos Humanos observações escritas sobre o pedido de parecer consultivo do Estado da Costa Rica sobre a mudança de nome de pessoas transgêneros. A DPRJ sugere que a Corte Interamericana interprete a Convenção Americana de Direitos Humanos para fixar aos Estados parte o dever de estabelecer procedimentos céleres, gratuitos e acessíveis para a retificação do nome e do sexo nos registros e documentos oficiais, de acordo com a identidade de gênero autopercebida por cada pessoa.
As solicitações constam em um comunicado enviado pela DPRJ à Corte, na última sexta-feira (9), no procedimento de consulta feito pela Costa Rica. A defensora Lívia Casseres, coordenadora do Núcleo de Defesa dos Direitos Homoafetivos e Diversidade Sexual (Nudiversis) da DPRJ, explicou que o país questionou à Corte Interamericana se, à luz da Convenção de Direitos Humanos, seria obrigação do Estado garantir a mudança de nome com base na identidade que a pessoa se percebe. E mais: se o procedimento dependeria de processo judicial ou poderia ser feito apenas por meio de pedido administrativo, o que seria mais rápido e acessível.
A corte abriu prazo para que outros interessados opinassem sobre as questões. Não há data para o sistema interamericano emitir um parecer consultivo. Contudo, uma vez adotada, a interpretação da Corte deverá ser aplicada no sistema judicial interno dos Estados que aderiram à sua jurisdição.
No documento, a DPRJ defendeu a obrigação dos países respeitarem a identidade de gênero com base em três dispositivos da Convenção Americana de Direitos Humanos. Um deles é o artigo 11, que trata da proteção da honra e da dignidade e que garante que ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada. O outro é artigo 18, que estabelece o direito ao nome. O último é o artigo 24, que diz todas as pessoas são iguais perante a lei, por isso têm direito, sem discriminação alguma, à igual proteção da lei.
No documento enviado à Corte Interamericana de Direitos Humanos, a DPRJ disponibilizou uma pesquisa feita pela Diretoria de Estudos e Pesquisas da instituição sobre acesso à justiça. De uma amostragem de 170 ações de retificação de nome e sexo movidas pela Defensoria Pública somente na capital e na região metropolitana do Rio de Janeiro, entre 2010 e 2016, apenas 47 foram integralmente atendidas pelo Judiciário.
No período analisado, a Justiça do Rio sentenciou apenas 69 casos – ou seja, 40,6% dos processos ajuizados pela DPRJ neste período. Os restantes aguardam julgamento.
Dos casos julgados, somente 47 (68% do total de casos já sentenciados) tiveram os pedidos de mudança de nome e sexo atendidos. Outros 17 (25%) foram julgados procedentes em parte, deferindo-se apenas a retificação do nome, mas não a do sexo jurídico da pessoa.
Segundo o levantamento, o tempo de julgamento dos casos gira em torno de 638 dias, o que não é compatível com as diretrizes da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
– Outra grave constatação é a grande quantidade de sentenças nas quais foi reconhecida a retificação de prenome, mas negada a mudança do sexo jurídico da pessoa simplesmente em razão de não ter havido cirurgia modificadora da genitália. Significa dizer que, não raro o Judiciário brasileiro impõe a realização de cirurgias genitais como condições para o acesso à identidade civil compatível com a autopercepção de gênero do indivíduo – afirmou a DPRJ no comunicado à corte.
Clique aqui para ler o comunicado.