"Ó vida futura: nós te criaremos". A frase de Carlos Drummond de Andrade, lida por Carolina Hennig Gomes, fechou o discurso de posse dos 71 novos defensores e defensoras do Estado do Rio de Janeiro, na noite desta terça-feira (15), no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, na Cinelândia. Os aprovados no XXVII Concurso para Carreira de Defensores da DPRJ - em sua maioria mulheres - falaram da coragem que os levou até ali:
- Realizar o nosso concurso foi um grande ato de coragem. Coragem de ter uma Defensoria cada vez mais potente, democrática e diversificada. Coragem de fazer autocrítica e de olhar não só para fora, mas também para dentro, com um regulamento para que as cotas fossem, finalmente, efetivas - discursou Jamila, em nome dos colegas.
De fato, em mais de 60 anos de história da instituição, a política de cotas foi efetivada, como lembrou o defensor público-geral, Rodrigo Pacheco, que também falou de coragem:
- Esse concurso foi um ato de coragem. De olhar para dentro, reconhecer erros, ouvir falas duras e necessárias. Me lembro da posse do XXVI quando a sociedade civil nos questionou sobre não termos efetivado nunca uma política de cotas. A partir dessa experiência, surgiu um trabalho primoroso, com muito afeto e muito acolhimento para que tivéssemos uma mudança radical na nossa política de cotas - disse Pacheco. - Estamos hoje num momento histórico. A promoção de direitos humanos exige proatividade e diálogo, sem aguardar a demanda chegar. A sociedade os espera, sejam bem-vindos - afirmou.
O concurso teve público recorde, com mais de 12 mil candidatos(as) inscritos(as), e um regulamento precedido por amplo debate público com a sociedade civil. Dos 71 aprovados(as), 20 são negros(as), sendo uma classificada por ampla concorrência e 19 pelas cotas; um novo defensor tem deficiência e três são hipossuficientes economicamente. A maioria dos aprovados(as) é formada por mulheres: são 53 defensoras e 18, homens.
- Num país em que a cada 23 minutos um jovem negro é morto, em que, como disse Conceição Evaristo, “eles combinaram de nos matar, mas nós combinamos de não morrer”, hoje estamos fazendo muito mais do que não morrer: estamos alcançando um espaço que nos foi negado por séculos - disse Jamila em outro ponto do discurso, que falou também de esperança:
- A Defensoria é verde porque é esperança pros réus no processo penal, esperança pra quem está preso, pra quem tem medo de perder sua casa, pra quem precisa de remédio, pra quem ainda não foi ouvido, pra quem já bateu em tantas portas. É ser, tantas vezes, a última esperança de alguém - disse Carolina.
O jornalista Diego Sarza deu início ao evento, saudando a todos e todas e falando sobre Cidadania, palavra que poderia ser sinônimo de Defensoria:
- Defensorar, por essas bandas, já deixou de ser neologismo e passou a ser verbo imperativo. Ele vai muito além da atuação jurídica. Muitas vezes, ele significa apenas ouvir, abraçar, acolher. O caminho que começa a ser trilhado por vocês é cheio de espinhos, mas estejam certos que cada sorriso de gratidão os fará esquecê-los - discursou Diego, continuando: - A partir de hoje, vocês passam a ser agentes da Cidadania. Passam a ser instrumentos na promoção de Direitos, a mão estendida para que os indivíduos possam, de fato, intervir e usufruir dos seus espaços. A jornada está apenas começando - concluiu.
Música, discursos e homenagens
A Orquestra da Grota, formada por jovens músicos moradores da comunidade da Grota, em Niterói, se apresentou no palco, emocionando convidados e convidadas com clássicos da música brasileira como Xote das Meninas e Asa Branca, de Luiz Gonzaga. Um vídeo institucional foi exibido, com depoimentos de assistidos e assistidas, servidoras e servidoras, defensoras e defensores.
A mesa solene foi formada pelo defensor público-geral Rodrigo Pacheco; o procurador-geral do Estado do Rio de Janeiro, Bruno Dubeux; a subprocuradora-geral de Justiça e Planejamento e Políticas Institucionais, Ediléa Gonçalves dos Santos Cesário, representando o procurador-geral de Justiça, Luciano Mattos; o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Luciano Bandeira; o procurador-geral do Município, Daniel Bucar; a presidenta da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep) Rivana Barreto Ricarte; a presidenta da Associação dos Defensores Públicos do Estado do Rio de Janeiro (Adperj), Juliana Lintz; a corregedora-geral da Defensoria Pública do Rio, Katia Varela Mello; o ouvidor-geral da DPRJ, Guilherme Pimentel e o presidente da Caixa de Assistência aos Membros Da Defensoria Pública (Camarj), Paulo Vinicius Cozollino.
Após a execução do Hino Nacional Brasileiro, o defensor Alexandre Marinho Vilela dos Santos conduziu o juramento feito pelos novos defensores, que prometeram “Servir a Defensoria Pública, orientando os juridicamente necessitados, postulando e defendendo os seus direitos.”
Os candidatos aprovados receberam o pin da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, entregues pelo servidor Pedro Ferreira e pelas defensoras Carolina Anastácio, Adriana Britto e Viviane Aló.
O presidente da Assembleia Legislativa do Rio, deputado André Ceciliano, não pôde estar presente, mas enviou um vídeo parabenizando os novos defensores: "A carreira de defensor público é a mais nobre no ramo do direito. Parabenizo a Defensoria, os novos defensores e a população do Rio de Janeiro que precisa de vocês".
- Todos aqui são de extrema importância para a população vulnerável porque o trabalho de cada defensor significa a transformação na vida de milhares de pessoas. Esse concurso representa a vitória na luta pela implementação da política de cotas em nossa instituição - continuou Juliana Lintz, presidenta da Adperj.
A presidenta da Anadep, Rivana Ricarte, parabenizou a ousadia da Defensoria por realizar um concurso tão grande, num momento tão difícil de pandemia.
- Precisamos celebrar este crescimento. Mudam-se as pautas, mudam-se as pessoas, mas a vontade continua. Os ataques que recebemos quanto a qualquer ação da Defensoria, para mim, significa que estamos no caminho certo - afirmou.
O procurador-geral do Estado do Rio de Janeiro, Bruno Dubeux, levou ao evento uma mensagem do governador do Estado do Rio, Cláudio Castro, que não conseguiu comparecer, sobre o momento em que as instituições do Estado voltaram a realizar concursos e que vai de encontro com a retomada da credibilidade do estado e das instituições.