Uma pesquisa da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ), pautada no estudo de 68 processos judiciais com acusações de constituição de milícias, aponta as principais atividades, localidades e crimes que configuram a existência dessas organizações criminosas. Segundo o estudo, 11 fatores são os principais determinantes para enquadrar uma acusação como “atividade de milícia''.
O relatório produzido pela Defensoria considerou processos de 2ª instância, apelações e recursos em sentido estrito. O objetivo foi identificar, através da leitura e estudo de 68 decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) datadas de 2018 e 2019 e baseando-se nos apontamentos feitos pelos desembargadores, o que de fato pode ser enquadrado como milícia a partir de fundamentações ou disposição dos crimes analisados em cada processo. Nove desses acórdãos correm em segredo de justiça, por isso algumas estatísticas só puderam ser analisadas em 53 deles.
Entre os processos analisados, testemunho policial; testemunhas civis; comercialização ou prestação de serviços; fatos ocorridos em “localidade de milícias”; cobrança de “taxa de segurança”; veículo utilizado fruto de ação criminosa; itens apreendidos com suspeito de envolvimento; suspeito envolvido é agente público; confissões; decisão baseada em denúncia do Ministério Público; e decisão baseada em denúncia anônima recebida por policiais formam os fatores primordiais apontados pelo relatório. Outros motivos determinantes também são citados. Contudo, quase sempre esses são os 11 aspectos priorizados para confirmação do envolvimento dos réus nas atividades e milícias.
No total dos processos analisados, 19 foram julgados em 2ª instância em 2018 e 34 em 2019, julgados em sua maioria como associação criminosa, constituição de milícia privada ou organização criminosa; crimes contra o patrimônio; crimes contra a vida; e Estatuto do desarmamento, além de outros tipos penais menos citados. Em 73,5% dos casos o relato policial foi considerado prova da caracterização da milícia.
Também em decorrência do segredo de justiça, alguns processos não tiveram reveladas as informações sobre a localidade das ocorrências. Entre os 47 que apresentam esses dados, revela-se que os municípios mais afetados pelas milícias são Rio de Janeiro com 36 processos, além de Duque de Caxias, Nova Iguaçu, São João de Meriti e Seropédica com dois casos e Itaguaí, Mangaratiba e São Pedro da Aldeia com apenas um. A maior parte dos das denúncias foram registrados na Zona Oeste da capital, com 33 ocorrências, sendo 12 em Campo Grande.
O relatório pontua que, devido à complexidade dos casos relativos às atividades típicas de milícia, é difícil caracterizar a prática a partir de definições de elementos fundamentais. Apesar dos fatores considerados como contribuintes para determinar o que de fato são milícias, não é possível concluir se um destes, por si só, é suficiente para determinar a caracterização das suas atividades.
- O levantamento foi realizado a partir dos acórdãos coletados na pesquisa de jurisprudência do TJRJ. Apesar de tratar apenas de casos de segunda instância, é interessante observar que, no mesmo período, a pesquisa com o termo tráfico de drogas retorna 50 vezes mais processos do que com o termo milícias, indicando que mesmo com as áreas dominadas por milícias estarem crescendo no Estado, esse tipo de crime não domina o judiciário como o de tráfico de drogas - disse a diretora de Estudos e Pesquisas da Defensoria, Carolina Haber.
A pesquisa completa está disponível aqui
Texto: Igor Santana