A Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ), junto a outras instituições de garantia dos direitos humanos, participou nesta terça-feira (26) de reunião com a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH). O encontro teve como tema a realização das audiências de custódia por videoconferência, que foi permitida em resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no fim de 2020, mas que, na visão das entidades, viola os direitos fundamentais e vai contra a natureza do instituto.
 
Isto se dá porque as audiências de custódia buscam permitir que a pessoa presa seja levada à presença do juiz após a prisão em flagrante, para que seja avaliada a legalidade e necessidade da prisão, e verificado se ocorreu tortura ou maus tratos. A Defensoria do Rio entende que, na videoconferência, isso não é realizado adequadamente – por um lado, há limitações que a comunicação por vídeo gera naturalmente, como impossibilidade de verificar expressões corporais, mudanças na respiração e possíveis sinais visíveis de maus tratos e torturas. Além disso, há a possibilidade de que a pessoa presa não sinta segurança em denunciar tortura que tenha sofrido a pessoas do outro lado de uma tela, seja por temer estar sendo ouvido por agressores, ou mesmo por estar realmente coagido sem que isso seja percebido por quem não está presente.
 
A questão foi primeiro levada à CIDH em dezembro do ano passado, quando se reuniu com entidades da sociedade civil de vários países para colher relatos de ameaças aos direitos humanos. A reunião desta semana foi específica sobre audiências de custódia por videoconferência no Brasil, e marcada pela própria Comissão. Além da Defensoria do Rio, participaram da reunião Conectas Direitos Humanos, o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), a Defensoria Pública de São Paulo, os Mecanismos Nacional e Estadual (do Rio) de Prevenção e Combate à Tortura, a Associação para Prevenção da Tortura (APT), e representantes de familiares de presos, além de outros instituições representantes da sociedade civil. 
 
A Coordenadora do Núcleo de Audiências de Custódia da DPRJ, Mariana Castro, realizou a sustentação oral em nome da Defensoria na sessão em que CNJ aprovou a realização de audiências de custódia por videoconferência, e retornou a defender as ideias da instituição nos encontros com a CIDH em dezembro e nesta terça. Segundo ela, não se pode aceitar a argumentação de que, com a pandemia, a única saída seria a realização de audiências remotas. 
 
- Não é sustentável a afirmação do Conselho de que a única saída para a realização das audiências de custódia durante a pandemia seria a realização por videoconferência. Muito pelo contrário. É possível sim a adoção de medidas para garantir a realização segura das audiências presenciais, não havendo qualquer justificativa para sua realização por videoconferência - comentou Mariana durante o encontro.
 
Mariana pontua também que, além de os gastos para realização remota, com câmeras, computadores e outros equipamentos, que são maiores do que o custo para adaptações presenciais, as audiências por videoconferência não configuram audiências de custódia, pois não se prestam aos fins a que elas se destinam. 
 
- A prática de tortura é extremamente corriqueira no Brasil de modo geral. A videoconferência pode acabar gerando respostas falsas e subnotificação, porque a pessoa não vai sentir segurança de denunciar a tortura para pessoas que estão do outro lado de uma tela; pode temer estar sendo entreouvida, e pode mesmo estar sendo coagida por trás das câmeras. Além disso, tampouco vai ser perceptível se aquela pessoa sofreu tortura. Isso vai gerar enfraquecimento da audiência de custódia como instrumento de prevenção e combate à tortura. Como a tortura atinge sobretudo pessoas negras, conforme comprovam pesquisas da própria Defensoria, o enfraquecimento das audiências de custódia mina também a promoção da equidade racial - complementou Mariana.



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